quinta-feira, 28 de agosto de 2014

Continuando a homenagem aos Pais

Aos que já se foram, uso as palavras do discurso de Helvécio, meu irmão, na missa de sétimo dia de nosso pai, o professor René.
Tudo o que ele disse naquele dia, hoje eu digo para todos aqueles que como o nosso pai plantou, adubou e colheu durante o seu ministério concedido por Deus aqui na terra.

Na íntegra o discurso proferido pelo Coronel Helvécio, um dos orgulhos de nosso pai:

MISSÃO CUMPRIDA

Amado pai, querido Professor René.
Eu e outros irmãos tivemos a oportunidade de tê-lo tanto quanto pai como professor e isto foi um privilégio enorme.

Estamos pois, aqui a rezar, por tua alma, para que ela possa ganhar, o quanto antes, a tua salvação eterna.

Nosso pai e nosso professor! Nesta missa de sétimo se cumpre um dos muitos rituais católicos que tem fundamento na ressurreição de Cristo, sem a qual nossa vida seria vazia.

Tal celebração tem origem no antigo ritual romano de São Pio V, que entre tantas versões,  provavelmente se fundamenta no II livro dos Macabeus. Neste livro, no Capítulo "Sacrifício pelos Mortos", relata-se quando Judas Macabeu fez uma coleta, enviando-a a Jerusalém para que fosse oferecida em sacrifício pelos pecados dos mortos:

"Belo e santo modo de agir, decorrente de sua crença na ressurreição, porque se ele não julgasse que os mortos ressuscitariam, teria sido em vão e supérfluo rezar por eles. Mas se ele acreditasse que uma bela recompensa aguarda aos que morrem piedosamente, era isto um bom e religioso pensamento, eis porque ele pediu um sacrifício expiatório para que os mortos fossem livres de suas faltas". (Macabeus, XII, 43 a 46 ).

Certo é que este costume da missa de sétimo dia, esta reverência que só se prática na fé Cristã da Santa Sé, nasceu da necessidade das pessoas de refletir e desejar aos amigos e parentes falecidos uma boa ressurreição em JESUS CRISTO, e um bom descanso eterno.
Não poderia também deixar de citar Charles Chaplin, que certa vez disse:

"Cada pessoa que passa em nossa vida passa sozinha e isso porque cada pessoa é única e nenhuma substitui a outra.
Cada pessoa que passa em nossa vida passa sozinha e nos deixa só, porque deixa um pouco de si e leva um pouquinho de nós.
Essa é a mais bela responsabilidade de vida e a prova de que as pessoas não se encontram por acaso".

Assim, querido pai e amado professor, temos a certeza de que levaste um pouquinho de nós, mas certamente nos deixaste muito de ti.

Sabemos que a honradez e a integridade foram os gabaritos de tuas atitudes, modeladas pelo bem e pela grandeza de coração.

Que estas medidas justifiquem teus erros cometidos ao longo da jornada terrena e tuas imperfeições humanas, mas possam também servir de baliza ao TODO PODEROSO na concessão do teu passaporte para a eternidade.

Somos felizes por tê-lo tido por 92 anos bem vividos, graça esta que a poucos Deus concede, pois, fazendo minhas as palavras do Inimá: "tu araste, adubaste, plantaste e colhestes", enfim, cumpristes toda a missão que Deus lhe deu.

Descanse em paz meu pai! Durma feliz velho mestre! E que a salvação eterna seja para ti a premiação do bom combate, que levaste a cabo durante toda a vida, pois foi Deus quem te fez e é preciso que tu voltes para Ele.

Amém, Jesus.

domingo, 10 de agosto de 2014

Dia dos Pais

Este dia é maravilhoso pois comemoramos o dia daquele que nos educou, nos deu exemplo, nos amou, e nos ensinou a caminhar.

PAI, palavra tão pequena e que significa muito. PAI, amor que não se compara.
Ter um PAI é ter um porto seguro que nunca se desmancha, nunca se danifica, nunca desaparece. Ele é eterno.

Meu PAI foi para os filhos e netos este ancoradouro, este alicerce durante toda sua vida e, Deus nos deu a alegria de te-lo ao nosso lado durante 92 anos.

Hoje seu exemplo é vivido, seguido, e cultuado por nós seus filhos e netos, assim como por muitos que tiveram o privilégio de conviver com ele.

Estendo a todos os pais do Brasil e do mundo as palavras ditas no discurso pronunciado por meu irmão, Helvécio de Deus Severo, em homenagem ao nosso pai.

A seguir as palavras do Coronel Severo, o filho caçula de René de Deus Vieira, no dia em que a Turma do Tiro de Guerra da cidade de Patos de Minas, homenageou o saudoso Professor dando-lhe o seu nome para a turma de 2014.

Srs e Sras autoridades aqui presentes. Srs atiradores da Turma TG 04-013/2014, queridos presentes.Em nome da minha mãe, que está aqui presente, e em nome da família “Deus Vieira”, venho aqui prestar nossos agradecimentos pela escolha do nome do nosso pai, e querido Professor René, para intitular esta nova turma de atiradores do Tiro de Guerra de Patos de Minas.Certamente ele, de onde estiver, estará muito feliz com esta homenagem, pois ela, juntamente com outras já ofertadas a ele pela sociedade patense, vem confirmar que ao longo de sua vida o nosso professor atingiu as metas por ele tão perseguidas.Dono de uma personalidade forte e de uma determinação sem igual, o meu pai e o nosso mestre tinha a ambição de fazer com que seus discentes se tornassem pessoas melhores, inteligentes, e, porque não, expoentes da sociedade brasileira, pois sabia que somente com educação seria possível mudar nosso país.Bom, eu poderia passar a noite discorrendo sobre as qualidades desse grande homem, mas resolvi enfatizar apenas quatro delas, que sugerem das iniciais da frase Professor René de Deus Vieira:

Da letra P, de Professor, me veio à mente a palavra Proficiência, que se entende por conhecimento cabal e perfeito de alguma ciência ou arte.  Inquestionavelmente o professor era proficiente no exercício das ciências exatas, mas o que talvez a maioria não saiba é que ele foi muito melhor na arte de ajudar na formação do cidadão, fosse ele seu aluno, ou não. E foi por essa visão que mesmo aqueles que não tinham muita afinidade com a matemática tinham para com ele grande apreço, sendo esta homegem uma prova cabal dessa faceta de sua personalidade.Da letra R, de René, vem à memória a palavra Reconhecimento. Não se trata aqui do reconhecimento que ele recebeu formalmente ao longo da vida, mas da que ele prestou reservadamente aos seus alunos, parentes e amigos, quando a ele lhes foram apresentadas as vitórias e derrotas de cada um.Do seu jeito ímpar, o meu pai foi capaz de extrair de dentro de toda a sua simplicidade, palavras de incentivo e de direcionamento, de carinho e de repreensão nos momentos mais pertinentes, tendo sido capaz de mostrar um rumo a ser seguido a cada um que o procurava. E também, como não poderia ser diferente, também teve a capacidade de reconhecer suas impossibilidades frente a certos fatos da vida, momento em que era acolhido por todos que o admiravam e amavam, tendo sido assim até sua partida.

Do D, de Deus, não poderia decorrer outra palavra que não a Doação: Doação é o substantivo mais pertinente a qualificar a profissão de professor, e, indubitavelmente, a função de pai.  Logo, posso dizer com prioridade que René de Deus Vieira passou pela vida para se doar duplamente a todos, tendo feito isso com maestria e muito amor.

Como pai, acredito que não preciso sequer adentrar nos exemplos de doação praticados por ele, mas como professor, vale ressaltar que foi por meio de horas de estudo, de trabalho e de persistência junto a jovens alunos que ele conseguiu fazer com que estes se tornassem adultos bem sucedidos como profissionais liberais, juízes, delegados, padres e até militares da escola de oficiais, os quais, hoje, já se tornaram coronéis e generais do Exército Brasileiro.        Do V de Vieira, decorre a palavra Valorização. Sério, austero e firme em suas convicções eu me lembro bem quando aos oitenta anos de idade o pai nos disse que deixaria de fazer o que mais gostava, que era ser professor, para não prejudicar seus alunos, pois a defasagem de idade entre ele e seus discípulos estava se tornando uma dificuldade para que ele pudesse usar a matemática e a física como um fator de integração social.Disse isso por entender que o ensino anda de mãos dadas com os anseios da sociedade, e a ele, naquela idade, não estava mais sendo possível atender seus alunos com a tecnologia hoje disponibilizada, pois sabia que ela jamais se compararia aos instrumentos que ele aprendeu a utilizar para lecionar nos idos dos anos 60.

Entendeu, portanto, que como forma de valorização da escola e dos seus alunos, estava na hora do mestre sair de cena, ficando para aqueles que aprenderam com ele a lembrança de aulas e de ensinamentos que jamais se repetirão, e para aqueles que não o conheceram, a oportunidade de aprender ciências exatas como a modernidade se incumbiu de fazer.

Assim, com essas colocações, reafirmamos em nome do Professor René os nossos agradecimentos por essa homenagem tão valiosa para nós e para ele, que sempre foi amante da hierarquia e disciplina das forças armadas.

Muito obrigado.

Família Deus Vieira



Aniversário de Rubem Branquinho

Tive a honra de participar de uma bela festa em homenagem ao grande amigo Rubem Branquinho,  no dia de seu aniversário, 14 de julho de 2014.


Um ponto marcante da festa foi a presença das famílias Branquinho, Deus Vieira, Mundim e tantas outras ligadas ao Rubem.



A união destas famílias transparece harmonia e transborda amor.



A minha história nesse belo evento começou um pouquinho antes . . .

Alguns nos atrás, estávamos na casa de meu pai, “Professor René”.

Papai, eu e Rubem Branquinho conversávamos na pequena sala de entrada da casa de meu pai sobre as poesias e histórias dos escritores portugueses e brasileiros.

Papai declamou  algumas estrofes das poesias que mais gostava, dentre as muitas que conhecia. Comentei que amava poesias porque, desde pequena, ouvia meu pai declama-las para minha mãe ou mesmo sozinho em seu escritório.

Rubem falou também de sua admiração por poesias e declamou a primeira estrofe de uma que nunca esqueceu, “A História do Cão Veludo”. Papai e eu ficamos emocionados ao ouvi-lo.

- Ouvi-a quando era rapazinho, disse Rubem. A poesia é sobre a  história de amor de um cão para com seu dono.  Fiquei muito comovido pela modo como o autor expressou o amor. É uma poesia para ser propagada, declamada para grandes públicos e comentada em encontros de amigos, família e trabalho.

Como sou contadora de histórias, logo interessei-me e disse:

- Rubem, que riqueza, poderia mandar-me essa poesia? Vou memoriza-la para contar um dia nas rodas de histórias que frequento.

- Claro que a enviarei, respondeu-me com entusiasmo, mas com uma condição, você terá que declama-la um dia para mim.

- Com muito prazer, basta você marcar a data, respondi.

Recebi a poesia e o tempo passou . . . meu amado pai faleceu . . .

Memorizei a poesia, mas não comentei nada com ninguém.  Nenhum fato mais relevante aconteceu, até o dia em que eu estava em casa tranquila quando o telefone tocou; era Silvana, minha prima e esposa do Rubem.

- Dedida, eu e minhas filhas estamos preparando uma festa surpresa para o Rubem, no dia em que completará setenta anos de idade, 14/07/2014. Pensei que nesta data você poderia homenageá-lo, declamando a poesia do Cão Veludo. Ele ama esta poesia e desde a primeira vez que ouviu nunca mais teve a oportunidade de ouvi-la novamente.

Fiquei surpresa com o convite e apreensiva também; mas, confirmei presença.

Nos dias que se sucederam, não fiz mais nada a não ser ler e reler a poesia.  Esperava por uma oportunidade, desde aquele dia em que conversávamos na casa de meu pai.

Foi um desafio para mim, pois havia muito tempo que eu não a declamava; mas, fui em frente.

Chegou o dia da festa.  Fomos para Brasília, eu e meu marido Ronaldo. Lá encontramos vários familiares da parte de Rubem e Silvana, além de amigos do casal.

Ficamos encantados com a maravilha do local do evento. Bem na entrada emocionei-me ao ver o nome: “Fazenda Onça do Barão”.  Esse nome vem de uma expressão que Rubem utiliza, algumas vezes, ao dirigir-se à sua amada Esposa e Filhas,  “Onças do Barão”, fazendo um resgate à memória de  seu sogro, que era conhecido com “César do Barão”.

A festa começou muito animada por um conjunto que tocava belíssimas músicas sertanejas, bem adequadas ao tema do evento.

Rubem não cabia em si de tanta felicidade. Recebeu várias homenagens e a todas agradecia com carinho.

Em certo momento,  Silvana aproximou-se de mim e disse:

- Dedida agora é com você.

A responsável pelo cerimonial me conduziu para perto do bolo de aniversário; e Ronaldo, meu esposo que está sempre ao meu lado, tomou o microfone e convidou o Rubem e sua família para se  aproximarem do bolo de aniversário. Pediu a todos os convidados um  minuto de silencio, pois neste instante eu iria fazer uma homenagem ao aniversariante.





Rubem não sabia, até então, do que se tratava. Para sua surpresa e alegria, comecei a declamar a poesia do Cão Veludo. Ele olhou-nos com surpresa, pois jamais esperava esta homenagem. Ficou emocionado pois era a sua poesia de seu coração criança, que há muito tempo, não a ouvia de ninguém

Os que estavam próximos puderam perceber sua alegria e emoção, expressas na forma de discretas lágrimas.

Foi uma poesia longa, 33 estrofes, mas os convidados ouviam-me, silenciosamente, com curiosidade e atenção.

Para mim foi um momento lindo, de muito contentamento, pois pude levar ao coração de um grande amigo essa singela alegria.

No final Rubens abraçou-me emocionado. Agradeceu-me com alegria e gentileza. Apesar da poesia ter um enredo melancólico, Rubem surpreendeu-nos ao fazer seus comentários, pois realçou a  mensagem da mesma, valorizando o  significado da amizade e amor verdadeiros.

Foi assim que surgiu  a ideia de homenagearmos meu primo Rubem, com a história do “Cão Veludo”, em sua festa de aniversário.

Foi gratificante ouvir,  do próprio Rubem:

“POEMA DE BELEZA INIGUALÁVEL, LEMBRANÇAS DE MEUS TEMPOS DE MENINO”


Compartilhei a poesia na postagem abaixo,  para que todos amigos e familiares possam aprecia-la.

Cão Veludo

Os versos dessa poesia, embora tristes em alguns momentos, revelam que um amor puro e sincero não dá espaço para rancores. Onde há o amor, só existe espaço para o perdão e a busca pela felicidade da pessoa amada.

Eu tive um cão. Chamava-se Veludo:
Magro, asqueroso, revoltante, imundo,
Para dizer numa palavra tudo
Foi o mais feio cão que houve no mundo

Recebi-o das mãos dum camarada.
Na hora da partida, o cão gemendo
Não me queria acompanhar por nada:
Enfim - mau grado seu - o vim trazendo.

O meu amigo cabisbaixo, mudo,
Olhava-o ... o sol nas ondas se abismava....
«Adeus!» - me disse,- e ao afagar Veludo
Nos olhos seus o pranto borbulhava.

«Trata-o bem. Verás como rasteiro
Te indicarás os mais sutís perigos;
Adeus! E que este amigo verdadeiro
Te console no mundo ermo de amigos.»

Veludo a custo habituou-se à vida
Que o destino de novo lhe escolhera;
Sua rugosa pálpebra sentida
Chorava o antigo dono que perdera.

Nas longas noites de luar brilhante,
Febril, convulso, trêmulo, agitado
A sua cauda - caminhava errante
A luz da lua - tristemente uivando

Toussenel: Figuier e a lista imensa
Dos modernos zoológicos doutores
Dizem que o cão é um animal que pensa:
Talvez tenham razão estes senhores.

Lembro-me ainda. Trouxe-me o correio,
Cinco meses depois, do meu amigo
Um envelope fartamente cheio:
Era uma carta. Carta! era um artigo

Contendo a narração miuda e exata
Da travessia. Dava-me importantes
Notícias do Brasil e de La Plata,
Falava em rios, árvores gigantes:

Gabava o steamer que o levou; dizia
Que ia tentar inúmeras empresas:
Contava-me também que a bordo havia
Mulheres joviais - todas francesas.

Assombrava-me muito da ligeira
Moralidade que encontrou a bordo:
Citava o caso d’uma passageira...
Mil coisas mais de que me não recordo.

Finalmente, por baixo disso tudo
Em nota breve do melhor cursivo
Recomendava o pobre do Veludo
Pedindo a Deus que o conservasse vivo.

Enquanto eu lia, o cão tranquilo e atento
Me contemplava, e - creia que é verdade,
Vi, comovido, vi nesse momento
Seus olhos gotejarem de saudade.

Depois lambeu-me as mãos humildemente,
Estendeu-se a meus pés silencioso
Movendo a cauda, - e adormeceu contente
Farto d’um puro e satisfeito gozo.

Passou-se o tempo. Finalmente um dia
Vi-me livre d’aquele companheiro;
Para nada Veludo me servia,
Dei-o à mulher d’um velho carvoeiro.

E respirei! «Graças a Deus! Já posso»
Dizia eu «viver neste bom mundo
Sem ter que dar diariamente um osso
A um bicho vil, a um feio cão imundo».

Gosto dos animais, porém prefiro
A essa raça baixa e aduladora
Um alazão inglês, de sela ou tiro,
Ou uma gata branca sismadora.

Mal respirei, porém! Quando dormia
E a negra noite amortalhava tudo
Sentí que à minha porta alguem batia:
Fui ver quem era. Abrí. Era Veludo.

Saltou-me às mãos, lambeu-me os pés ganindo,
Farejou toda a casa satisfeito;
E - de cansado - foi rolar dormindo
Como uma pedra, junto do meu leito.

Praguejei furioso. Era execrável
Suportar esse hóspede importuno
Que me seguia como o miserável
Ladrão, ou como um pérfido gatuno.

E resolvi-me enfim. Certo, é custoso
Dizê-lo em alta voz e confessá-lo
Para livrar-me desse cão leproso
Havia um meio só: era matá-lo

Zunia a asa fúnebre dos ventos;
Ao longe o mar na solidão gemendo
Arrebentava em uivos e lamentos...
De instante em instante ia o tufão crescendo.

Chamei Veludo; ele seguia-me. Entanto
A fremente borrasca me arrancava
Dos frios ombros o revolto manto
E a chuva meus cabelos fustigava.

Despertei um barqueiro. Contra o vento,
Contra as ondas coléricas vogamos;
Dava-me força o torvo pensamento:
Peguei num remo - e com furor remamos

Veludo à proa olhava-me choroso
Como o cordeiro no final momento,
Embora! Era fatal! Era forçoso
Livrar-me enfim desse animal nojento.
No largo mar ergui-o nos meus braços
E arremessei-o às ondas de repente...
Ele moveu gemendo os membros lassos
Lutando contra a morte. Era pungente.

Voltei à terra - entrei em casa. O vento
Zunia sempre na amplidão profundo.
E pareceu-me ouvir o atroz lamento
De Veludo nas ondas moribundo.

Mas ao despir dos ombros meus o manto
Notei - oh grande dor! - haver perdido
Uma relíquia que eu prezava tanto!
Era um cordão de prata: - eu tinha-o unido

Contra o meu coração constantemente
E o conservava no maior recato
Pois minha mãe me dera essa corrente
E, suspenso à corrente, o seu retrato.
Certo caíra além no mar profundo,
No eterno abismo que devora tudo;
E foi o cão, foi esse cão imundo
A causa do meu mal! Ah, se Veludo

Duas vidas tivera - duas vidas
Eu arrancara àquela besta morta
E àquelas vis entranhas corrompidas.
Nisto senti uivar à minha porta.

Corri - abri... Era Veludo! Arfava:
Estendeu-se a meus pés, - e docemente
Deixou cair da boca que espumava
A medalha suspensa da corrente.

Fora crível, oh Deus? - Ajoelhado
Junto do cão - estupefato, absorto,
Palpei-lhe o corpo: estava enregelado;
Sacudi-o, chamei-o! Estava morto!


“POEMA DE BELEZA INIGUALÁVEL, LEMBRANÇAS DE MEUS TEMPOS DE MENINO”
Rubem Branquinho, em 14 de julho de 2014,  dia do seu aniversário.